quarta-feira, 7 de julho de 2010

Reportagem Final

O obstáculo é o governo

Skatistas de Juiz de Fora têm que fazer verdadeiras manobras para conseguir praticar o esporte


Aparecida Ferreira

Renan Vieira

Vitor Vizeu


Quem não sonhou em ser um jogador de futebol? Pelo menos no Brasil, a grande maioria dos jovens já sonhou. O futebol foi eleito por unanimidade paixão nacional e, consequentemente, é o que mais atrai a atenção dos brasileiros. Na contramão desse cenário, outro esporte vem batalhando seu espaço. Há tempos visto como marginal, hoje o skate esta em terceiro lugar no ranking dos mais praticados. Em Juiz de Fora a história não é diferente. No entanto, mesmo com o crescente número de adeptos, o esporte ainda não recebe a atenção merecida e as condições para a prática continuam precárias.

Ao contrário do incentivo que cidades como São Paulo recebem, os skatistas de Juiz de Fora ainda sofrem com o descaso dos órgãos públicos responsáveis pelos esportes. Como forma de obter visibilidade, praticantes criaram uma associação que pudesse representá-los perante as autoridades. A Associação Juizforana de Skate, AJS, surgiu com esta finalidade, e conseguiu algumas melhorias durante os dez anos de sua existência. Mas quando se trata de reivindicações perante os governantes o caminho não é tão fácil.

Mobilização dos skatistas não faltou. “Em 1999, fizemos uma Audiência Pública na câmara para reivindicarmos a construção de pistas em áreas de lazer dos bairros da cidade. Foi o primeiro passo para melhorar as condições do skate.” lembra Gabriel dos Santos Rocha, o Biel, ex-deputado e um dos fundadores da AJS. Dessa audiência foram colhidos alguns frutos, porém sem a eficiência desejada.




Muitos projetos e pouca execução

Quando o projeto de construção de espaços destinados aos skatistas foi aprovado na Câmara Municipal, Frederico Batitucci Halfeld e Willian Gonçalves Ribeiro de Castro, arquiteto e engenheiro, respectivamente, projetaram as pistas e as plantas foram entregues à Prefeitura para que fosse executada a obra. “O Fred era o cara perfeito para fazer aquelas plantas, porque ele também é skatista, sabe bem qual é a nossa necessidade”, afirma Diogo Groselha, atual presidente da Associação.

A execução não foi fiel ao planejamento e o resultado pode ser visto hoje. As pistas estão em péssimas condições, esburacadas, sem proteção e fora da metragem indicada. Carlos Henrique, o Tutuca, morador da zona norte de Juiz de Fora e skatista, afirma que, do jeito que as pistas estão, é impossível praticar o esporte. Como ele, outros praticantes reclamam dos problemas encontrados.

Conseqüência disso é o aumento de skatistas andando nas ruas da cidade, principalmente no Centro. Isso representa um risco não só para o praticante, mas também para os pedestres e outros automóveis. O presidente da Associação afirma que, devido ao tempo que pratica o esporte, já adquiriu a experiência necessária para andar em meio do trânsito, mas ele se preocupa com os novos praticantes, que ainda não possuem esta experiência, e podem sofrer acidentes.

A população acaba não se preocupando tanto com o esportista, dando foco para outros problemas, como perder o retrovisor, arranhar a lateral do carro e até mesmo com o barulho e danificações nas calçadas e portarias de prédios. Não deixam de ser problemas importantes, mas a atenção também deveria ser voltada para o skatista. “Até entendo que eles não têm lugar para andar, mas rua não é lugar de skate.” diz Letícia Araújo, estudante. O skatista Gláucio Silva, o Xuxa, conta que já sofreu acidentes por estar andando na rua. “Os carros às vezes não conseguem enxergar, já caí e me arranhei todo, por sorte não foi nada grave”. Geralmente o esportista não usa os equipamentos de proteção, o que aumenta ainda mais os riscos. “Se as pistas estivessem em boas condições, não haveria tanta gente andando de skate nas ruas, e os acidentes poderiam ser evitados”, reafirma Diogo Groselha.


Aumento do número de skatistas pode ajudar conseguir melhorias para o esporte

Os números revelam, em pesquisa realizada pela Datafolha, que hoje no Brasil mais de três milhões e oitocentos e sessenta mil pessoas andam de skate. Os dados mostram que houve um aumento de 20% em relação ao último levantamento, realizado em 2006 também pela Datafolha, que apontava a média de três milhões e duzentos mil skatistas. A Confederação Brasileira de Skate, CBSk, órgão máximo do skate brasileiro, espera que o esporte atinja a marca de quatro milhões de praticantes no final de 2010.

O aumento do número de skatistas traz benefícios claros para a evolução do esporte no Brasil. “Ao identificar o aumento do número de praticantes, teremos mais argumentos para defender projetos de melhoria para o Skate, junto ao poder público ou a patrocinadores em potencial. O resultado faz com que aumente a responsabilidade e até o dever dos governos (federal, estadual e municipal) em investirem em políticas públicas voltadas para o Skate,” avalia Marcelo Santos, presidente da CBSk.

A falta de infra-estrutura para a prática esportiva não é um problema exclusivo de Juiz de Fora. Apesar do cenário positivo, resultado da melhora da realidade econômica do país e do aumento do poder de compra da população, ainda há muito ser feito para que o skate continue evoluindo como esporte. O número total de pistas no país é de 1024, de acordo com a fonte mais recente do Guia de Pistas da CEMPORCENTOSKATE de 2006, quantidade que não acompanha o número de praticantes no país.

“Um dos fatores que dificulta o crescimento do número de pistas na mesma proporção que o número de praticantes, é que geralmente se trata de obras públicas realizadas por prefeituras ou governos estaduais. E como sabemos, no nosso país, a execução de qualquer obra pública é muito demorada e burocrática, o que às vezes faz com que uma pista demore anos para sair do papel, até ser inaugurada”, analisa Marcelo Santos.


Prefeitura diverge de skatistas em relação ao investimento


Não existe um levantamento com o número de skatistas de Juiz de Fora. A AJS estima que a cidade tenha algo em torno de quatro mil praticantes. A Secretaria de Esportes de Juiz de Fora afirma que não tem esses dados. A mesma secretaria diz que a cidade conta com pistas que abrangem toda a região. Quanto aos investimentos, há divergência de opiniões entre praticantes e Prefeitura. “O skate é o esporte urbano mais equipado da cidade. Em toda parte existe um local para a prática do skate. E todos os projetos de futuras praças, quando a área é grande, há projeto de pista de skate, que agora, após contato da AJS, será acompanhada por um engenheiro experiente em construção de pistas de skate. No esporte ciclismo, por exemplo, não possui nenhum local destinado para sua prática, já que a cidade não comportaria uma ciclovia na região central.” explica Fabiana Duarte, responsável pelo setor Supervisão de Esportes Radicais, de Aventura e ligados à Natureza, vinculado à Secretaria de Esporte e Lazer da Prefeitura de Juiz de Fora.

Perguntada sobre a segurança na prática do skate na cidade, Fabiana afirma que “a prática de qualquer esporte requer o uso de equipamento de proteção individual, os EPI, cada um dentro de suas especificidades. Os EPI necessários para a prática do skate são: capacete, joelheiras e cotoveleiras. Acredito que a maioria dos praticantes não use. E quanto ao local de prática, acredito que a maioria utilize os destinados para tal, ou outros seguros, como praças e áreas sem movimentação de veículos.”.

Skatistas de Juiz de Fora e governo concordam que há, sim, a necessidade de reforma e construção regulares das pistas de skate da cidade, porém nada parece estar sendo feito. Resta agora mobilização dos órgãos responsáveis. Os skatistas prometem não descansar enquanto o problema não seja resolvido. A arte de superar obstáculos é especialidade deles.


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